Execução de Lázaro era esperada: 'É padrão das polícias', dizem especialistas
"A polícia cidadão, dentro do estado democrático de direito e dentro de um país que, no seu ordenamento jurídico não possui a pena de morte, nem delega a policiais a possibilidade de executar sentenças" afirma Pablo Nunes, (Photo by Sergio Lima / AFP)
Após 20 dias da ação que mobilizou mais de 270 policiais, Lázaro Barbosa foi capturado e executado nessa segunda-feira (28), em Goiás. Em meio a comemoração do governador do DF, Ronaldo Caiado, agradecimento à polícia ao vivo pela GloboNews e declaração de 'CPF cancelado' - feita pelo presidente Jair Bolsonaro em seu Twitter, especialistas em segurança pública afirmam que a morte do suspeito de ser 'serial killer do DF' não era exceção, e sim um procedimento padrão das polícias, mesmo não previsto em lei.
"Era esperado por conta da construção da narrativa que se formou no entorno dessa perseguição. Mas é óbvio que ela foge completamente de um resultado que seria esperado dentro de uma política pública de segurança, dentro dos procedimentos de uma polícia cidadã. A polícia cidadão, dentro do estado democrático de direito e dentro de um país que, no seu ordenamento jurídico não possui a pena de morte, nem delega a policiais a possibilidade de executar sentenças", defende o coordenador da rede de Observatórios da Segurança do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESEC), Pablo Nunes.
"A perseguição de um criminoso em fuga não deveria ser tratada como uma caçada. Não se trata de estarmos na caça, num safári a procura de animais para abater. A lógica mesmo que se impôs nessa lógica da caçada que se impôs desde o primeiro momento na fuga do Lázaro já implica na esperada morte dele. Uma caça é pra isso, né para bater aquele animal no caso, e assim ele foi tratado", completa.
Nas redes sociais, Jair Bolsonaro comemorou o resultado da operação. A primeira postagem do presidente a respeito do caso, nesta manhã, foi LÁZARO: CPF CANCELADO!
Rafaela Venturim, advogada criminalista, classifica a ação policial como modus operandi - atirar primeiro e perguntar depois. "É importante destacar que eram mais de 300 agentes policiais atrás de um só homem, de modo que nem sequer é possível falar em legítima defesa, dada a absoluta desproporcionalidade. A operação foi desastrosa do início ao fim, não ofereceu segurança à população local, não pareceu utilizar muito da inteligência operacional. Não é razoável que a busca por um só homem dure vinte dias. Tudo isso gerou tensão social e terminou por, mais uma vez, não oferecer qualquer resposta aos ilícitos penais imputados ao Lázaro". ressalta.
Agora são crimes sem solução — e se complica, também, a investigação a respeito do fazendeiro que ofereceu abrigo ao procurado. Cumpre ressaltar que ainda que Lázaro tivesse sido julgado e condenado, seu fim não poderia ser o assassinato, visto que a pena de morte não está prevista no ordenamento brasileiro.
Segundo Nunes, Caiado e os demais representantes e responsáveis pelas operações como esta deveriam lastimar o resultado. "Uma pessoa que comete em crime deveria ser julgada empresa pra cumprir a sua pena, e não executada em uma operação, mesmo que seja né para legítima defesa dos policiais. Sabemos que dentro ordenamento jurídico os policiais eles podem revidar uma injusta agressão se essa pessoa está colocando perigo à vida de outros ódio policial. Mas isso deveria ser tratado como exceção, infelizmente no Brasil essa lógica é tornada como padrão das polícias".
"Policiais sempre quiseram ele para matar, não para prender", diz mulher de Lázaro
A esposa de Lázaro Barbosa, identificada apenas como Elen, de 19 anos, declarou que os policiais envolvidos na operação nunca quiseram prender o criminoso, mas matá-lo. Após 20 dias de busca, Lázaro foi capturado e morto pela PM de Goiás nesta segunda-feira (28).
"Os policiais do Goiás sempre quiseram ele para matar, não para prender", disse a esposa em entrevista à Record TV. Elen afirmou estar em choque e arrasada. Ela ja havia declarado que temia pela morte do companheiro.
No décimo quarto dia de operação, 270 agentes das polícias civil e militar do Distrito Federal e de Goiás, cinco cães farejadores, helicópteros e outros recursos eram usados na busca por Lázaro Barbosa, que ganhou na imprensa e nas redes sociais o apelido de 'serial killer do DF'.
m meio a mata fechada, pontos de bloqueio são também feitos por homens da Policia Federal e Rodoviária. A operação contou também com disque-denúncia e ganhou cada vez mais notoriedade nacional e caráter predatório. Especialistas já afirmavam que a forma como o caso é noticiado, bem como a ação das forças de segurança, colocava a vida de Lázaro em risco, alem de reforçar discursos como o da justiça com as próprias mãos.
A pesquisadora do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, Mariana Diniz, comentou como a celebração de operações é danosa para a segurança pública. "Resultou que essa caçada colecionou discursos punitivos que são uma mistura de gozo e poder, tão danosos em uma sociedade racista, cujo sistema penal executa uma verdadeira necropolítica, de modo que Lázaro reforça o estereótipo de um sujeito que pode ser morto pela polícia sem que haja consequências - e ainda comemoração".
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